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La pedagogía de la convivencia como posibilidad de relaciones y prácticas socioeducativas en el Rio de Janeiro – Brasil

The coexistence’s pedagogy as a possibility of relationships and socio-educational practices in Rio de Janeiro – Brazil

Autoría:

Arthur Vianna Ferreira, Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Brasil

Resumen

Este artículo, escrito en portugués en consideración al espacio de esta acción socioeducativa, busca presentar el estudio realizado sobre la organización de las prácticas educativas no escolares desarrolladas en una institución socioeducativa y la relación de los educadores sociales con los sujetos pobres del municipio de São Gonçalo – RJ. En este contexto, la Pedagogía Social se abordará como una teoría general de la Educación que propone intervenciones socioeducativas a favor de cambios en la realidad cotidiana de los individuos socialmente marginados. Con eso se denotará su definición, sus conceptos básicos y se desplegará una síntesis sobre su origen y relevancia histórica en Brasil. Dentro de esto, se trabajará la Pedagogía de la Convivencia, más específicamente, el campo teórico y práctico propuesto por Jares (2008) – entendido como una herramienta de Pedagogía Social -, y planteado como un posible camino para trabajar con los grupos encontrados en vulnerabilidad social. En este, se hará énfasis en la discusión del concepto de conflicto social, en el análisis de los elementos de la Pedagogía de la Convivencia en la organización del trabajo sociopedagógico y la forma en que interfieren, o no, en las negociaciones existentes entre los sujetos de este grupo.

Resumo

A pedagogia da convivência como possibilidade de relações e práticas socioeducativas no Rio de Janeiro – Brasil

Este artigo, escrito em português em consideração ao lugar desta ação socioeducativa, tem como objetivo apresentar o estudo realizado sobre a organização das práticas educativas não escolares desenvolvidas em uma instituição socioeducativa e a relação dos educadores sociais com as camadas empobrecidas do município de São Gonçalo – RJ. Nesse contexto, a Pedagogia Social será abordada como uma teoria geral da Educação que propõe intervenções socioeducativas em prol de mudanças na realidade cotidiana de indivíduos socialmente marginalizados. Primeiramente, organizou-se a definição, os conceitos básicos e a origem desse campo do saber, assim como, a sua relevância histórica no Brasil. Depois disso, desenvolveu-se a Pedagogia da Convivência, mais especificamente o campo teórico-prático proposto por Jares (2008), como uma ferramenta da Pedagogia Social e possível caminho para trabalhar com os grupos em situação de vulnerabilidade Social. Por fim, a análise foi realizada a partir do conceito de conflito social, como elemento da Pedagogia da Convivência e de organização do trabalho sócio pedagógico, buscando entender de que forma esses interferem, ou não, nas negociações educacionais entre os sujeitos deste grupo.

Abstract

This article, written in Portuguese respecting the place of this socio-educational action, presents the study on the organization of non-school educational practices developed at a socio-educational institution and the relationship of social educators within the poor people at São Gonçalo’s city in Rio de Janeiro. In this context, Social Pedagogy will be approached as a general theory of Education that proposes socio-educational interventions at favor of changes in the daily reality of socially marginalized individuals. With this, it defines the basic concepts will be denoted and a synthesis on its origin and historical relevance in Brazil will be displayed. Within this, the Pedagogy of Coexistence will be worked, more specifically, the theoretical and practical field proposed by Jares (2008) – understood as a Social Pedagogy tool -, and raised as a possible way to work with groups found in vulnerability Social. In this, emphasis will be placed on the discussion of the concept of social conflict, on the analysis of the elements of the Pedagogy of Coexistence in the organization of socio-pedagogical work and the way in which they interfere, or not, in the existing negotiations between the subjects. of this group.

Introdução: A Pedagogia Social vivenciado, também, no Brasil

A Pedagogia Social, segundo o educador alemão Hans-Uwe Otto (2011), teve sua origem na Europa, sendo organizada com maior intensidade na Alemanha a partir das últimas décadas do século XIX. Esse campo teórico tem em sua gênese o propósito de atender – mediante um viés pedagógico – as demandas mais urgentes oriundas das camadas empobrecidas e os problemas sociais que afetavam os grupos em situações de vulnerabilidade social. Nessa concepção, a:

Pedagogia Social baseia-se na crença de que é possível decisivamente influenciar circunstâncias sociais por meio da Educação. Assim, a Pedagogia Social começa com esforços em confrontar pedagogicamente aflições sociais na teoria e na prática (OTTO, 2011: 31).

Sendo assim, a Pedagogia Social busca impulsionar a melhoria de vida dos indivíduos flagelados e promover a transformação da realidade social na qual esses se encontram, isto é, ela atua “através da ação socioeducativa orientada a sujeitos e grupos em risco, provocar mudanças nas pessoas e na sociedade” (CALIMAN, 2010: 349).

Diante disso, ao ganhar maiores proporções – especialmente a partir do teórico Paul Natorp (1978, apud SOUZA, 2010), um dos primeiros a utilizar a expressão “Pedagogia Social” –, a área de estudos foi se disseminando para outros continentes, como o africano e, também, na América, onde Paulo Freire (1996, apud SOUZA, 2010), embora não tenha cunhado o termo, foi o maior expoente dessa modalidade socioeducacional por intermédio da sua “Educação Popular”.

(Mural en la Facultad de Educación y Humanidades, Universidad del Bío-Bío. Chile- Imagen en Wikipedia)

No Brasil, o campo epistemológico da Pedagogia Social permanece, ainda hoje, em constante processo de construção e permeado em embates acadêmicos. Contudo, as contribuições de Paulo Freire emergiram a partir da segunda metade do século XX, cujo trabalho já englobava as ideias centrais da Pedagogia Social, assim, mesmo “sem pensar nessa terminologia, concretiza suas principais reflexões a partir de suas práticas e conceitos sobre a educação das classes em vulnerabilidade social em todo o país” (FERREIRA, 2018: 34).

Nessa perspectiva, Moacir Gadotti (2012), ao salientar a importância do paradigma educacional de Paulo Freire, traduz de forma objetiva seu prisma sociopedagógico para com as parcelas marginalizadas socialmente:

[…] Paulo Freire (1967) pode ser considerado um grande inspirador da Pedagogia Social mesmo sem ter usado esse termo em seus escritos. Para ele, a pedagogia social caracteriza-se como um projeto de transformação política e social visando o fim da exclusão e da desigualdade, voltada, portanto, para as classes populares (GADOTTI, 2012: 26).

Portanto, a essência do trabalho de Freire aparece imbricada na concepção de práxis, ou seja, na redução da distância e ação conjunta entre teoria e prática, tendo com o intuito expor os conflitos sociais, as mazelas e contradições político-econômicas que impactam na vida da população empobrecida para que esses – através do exercício reflexivo, da autoconscientização de seus lugares no mundo e compreensão da realidade social – possam lutar pela ascensão social, alcançar suas autonomias e deixar o estado de exclusão social.

É válido destacar que, embora a sistematização do campo teórico e da área de pesquisa acerca da Pedagogia Social sejam relativamente recentes, a prática da Educação Social sempre existiu, pois, à medida que as sociedades tendem a excluir parte da população, o trabalho dos educadores sociais aparece para tentar sanar as desigualdades sociais geradas em seus determinados espaço-tempo históricos.

Nesse sentido, o conceito de Educação Social está relacionado à prática da Pedagogia Social, ou seja, é a concretização das ações sociopedagógicas por parte dos educadores sociais que buscam intervir na realidade dos indivíduos oprimidos em prol de possíveis mudanças/emancipações políticas, sociais e econômicas. Assim sendo:

[…] a finalidade da educação social é ajudar a compreender a realidade social e humana, melhorar a qualidade de vida, por meio do compromisso com os processos de libertação e de transformação social nas quais vivem ou sofrem as pessoas. (SOUZA NETO, 2010: 32).

Já a Pedagogia Social consiste na fundamentação científica para a realização das interferências sociopedagógicas junto às populações empobrecidas e os problemas sociais. Frente a isso, dentre as possíveis interpretações/definições sobre essa Ciência da Educação:

A Pedagogia Social pode ser vista tanto como uma teoria geral de Educação como também uma forma de evitar a redução da Educação unicamente aos processos de desenvolvimento individual. A Pedagogia Social pode também ser vista como um campo de estudo em que a conexão entre Educação e sociedade é levada em conta, ou, ainda, como uma esfera de atividades que combatem e amenizam problemas sociais por meio de métodos educacionais (OTTO, 2011: 32).

Assim, conforme podemos inferir, diante dos estudos realizados por Souza Neto, Silva e Moura (2009), que a efetuação da Pedagogia Social ocorre, principalmente, através de interferências educacionais caracterizadas pelas intencionalidades específicas direcionadas aos ambientes não formais, sendo ela planejada fora das instituições familiar e escolar, apesar de não as eliminar de sua esfera metodológica. Com isso, distingue-se da Educação Formal (escolar) e da Educação Informal (sem a sistematização da intencionalidade educativa).

(Imagen en Flickr)

Perante o exposto, cabe ressaltar que a Pedagogia Social é passível de inúmeras definições e formas de compreendê-la e, por não existir uma visão dominante sobre sua conceptualização, Caliman (2010) nos apresenta um conjunto de características que nos auxiliam na (re)formulação de um entendimento mais holístico – e jamais dogmático – para se (re)pensar e trabalhar diante das concepções e investigações em Pedagogia Social.

(A) a identificação e potencialização dos fatores sociais que, intencionalmente ou não intencionalmente, estão presentes nas diversas instituições da sociedade;

(B) doutrina da educação política e nacionalista do indivíduo, perspectiva que deu sustentação à educação dos cidadãos ao longo de diversas ditaduras europeias e até latino-americanas;

(C) como uma dimensão das ciências da educação que se ocupa da formação à “sociabilidade” humana, particularmente dentro das escolas;

(D) Pedagogia Social de base antroposófica (…) entendida como processo cujo resultado é a qualidade de vida na ecologia social; muito presente no Brasil e não coincide com nossa concepção;

(E) como pedagogia de ajuda para os casos de necessidade, com intenção preventiva e compensatória;

(F) Como pedagogia crítica em resposta à necessidade de solidariedade social para o desenvolvimento do voluntariado, instituições de acolhida, prevenção, recuperação, reinserção social. (CALIMAN, 2010: 334).

Dessarte, os elementos acima representados nos dão uma base para construirmos nosso campo de investigações e a consolidação da ação (prática) da Pedagogia Social para com as populações empobrecidas na região metropolitana do Rio de Janeiro.

Parte-se, diante disso, da concepção que todo indivíduo (independente do espaço-tempo em que se encontra) é um homo educandus (do latim “homem que educa”), logo, ele educa alguém e, consequentemente, é educado por outrem, mantendo, assim, uma dialética constante de intervenções socioeducativas que impactam na vida dos educadores sociais e dos educandos empobrecidos. Dessa maneira, este trabalho compreende que a Pedagogia Social – para se estruturar como campo epistemológico que visa promover a formação cultural e a inclusão social de grupos marginalizados – se constrói tendo como base temas essenciais que compõem as Ciências Políticas, a Antropologia Filosófica e a Pedagogia.

Ao transitar e buscar os elementos nos temas dessas áreas do conhecimento, a Pedagogia Social se alicerça permeando na Pedagogia, onde encontrará os fundamentos da educação, definirá métodos didáticos e estruturará todo o trabalho (prático) sociopedagógico em espaços não escolares a ser desenvolvido com os sujeitos em estado de vulnerabilidade social.

Já a Antropologia Filosófica vai proporcionar um vasto campo de reflexão para se tentar compreender a concepção de “ser humano”, pensando sobre suas essências e características, a constituição do consciente e do inconsciente individual perante seu grupo social, problematizando sobre o “ser/estar” humano, visto que há cidadãos em condições deploráveis.

(Imagen en Flickr)

Por fim, a Política vai contribuir com discussões acerca dos Direitos Humanos, democracia e construção da cidadania, ou seja, temáticas que irão tratar dos direitos e deveres dos indivíduos e o porquê de uma parcela da população se encontrar em circunstâncias degradantes. Assim, ao penetrar nessas searas e absorver componentes relevantes para arquitetar-se enquanto ciência que procura consolidar-se como uma teoria abrangente/geral da educação, a Pedagogia Social se organiza, define instrumentos e traça caminhos possíveis para atender as demandas postas pelas camadas empobrecidas, buscando impulsionar transformações nas realidades desses sujeitos.

Portanto, a partir da exposição mínima necessária em relação à história da Pedagogia social, ao seu conceito e elementos básicos, doravante iremos apresentar a Pedagogia da Convivência, como uma das vertentes da Pedagogia social para se investigar e instrumentalizar a organização das práticas (didáticas) socioeducativas desenvolvidas pelos educadores sociais para com os indivíduos pertencentes às camadas empobrecidas em espaços não escolares.

 A Pedagogia da Convivência como uma forma de fazer Pedagogia Social

Devido às condições de desigualdade político-econômicas e socioculturais enraizadas na sociedade brasileira – que marginalizam grande parte da população –, é imprescindível a aplicação de um conjunto de práticas socioeducativas para tentar promover transformações sociais que atendam as demandas das comunidades mais carentes com a finalidade de retirar esses sujeitos do estado de vulnerabilidade.

Diante disso, a Pedagogia da Convivência, desenvolvida por Xesús R. Jares (2008), é uma vertente teórico-prática que pode ser articulada com a Pedagogia Social, ou seja, é uma proposta de ação concreta pautada nos Direitos Humanos que busca intervir na realidade social mediante a valorização das relações e ações produzidas entre e pelos sujeitos em seus determinados grupos sociais, tendo como finalidade organizar espaços socioeducativos, impulsionar o processo de ensino-aprendizagem e, consequentemente, a mudança na conjuntura social.

Em nosso caso, frente à conjuntura social deplorável e desafiadora encontrada na região metropolitana do Rio de Janeiro, “a Pedagogia da Convivência é uma das possibilidades de organização das práticas socioeducativas construídas nos espaços não escolares da sociedade fluminense” (FERREIRA, 2018: 47). Logo, a Pedagogia da Convivência é uma ferramenta da Pedagogia Social que preconiza o prestígio da convivência como lugar do preferível para se materializar a educação social, para que os educadores sociais, junto à população carente, possam agir em prol de mudanças reais, planejando as práticas socioeducativas concatenadas ao “saber-fazer” oriundo de cada grupo excluído, isto é, buscando uma reversão do quadro da disparidade social por intermédio da educação que dê importância aos conhecimentos produzidos pelos pobres.

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Nessa perspectiva, à medida que os educadores sociais atuam nos espaços socioeducacionais não escolares (informais e não formais), devem prezar pela dinâmica da convivência para se estruturar seu trabalho social. Dessarte, o ato de conviver – ação elementar dos seres humanos – significa não somente ter relações sociais (fazer-se presente com para com outro cidadão), mas estabelecê-las por intercessão de acordos que assegurem relações pacíficas e democráticas entre as pessoas em seus grupos de pertenças sociais.

Conviver significa viver uns com os outros com base em certas relações sociais e códigos valorativos, forçosamente sujeitos, no marco de um determinado contexto social. Estes polos que marcam o tipo de convivência estão potencialmente cruzados por relações de conflito, o que de modo algum ameaça a convivência. Conflito e convivência são duas realidades sociais inerentes a toda forma de vida em sociedade (JARES, 2008: 25).

Com isso, cabe ressaltar a importância de levar em consideração que a convivência entre os indivíduos é permeada por conflitos inerentes às relações sociais e esses afetam o processo de ensino-aprendizagem. Entretanto, o conceito de conflito aqui trabalhado afasta-se da visão tradicional e corriqueiramente empregada, que é interpretado como algo ou alguma coisa indesejável, ruim, negativa, aproximando-o da definição de violência e de desgraça, logo, que precisaria ser evitado e, se possível, eliminado.

Assim, para o educador catalão, que reformula a concepção tradicional, o conflito é um processo natural, substancial, inevitável, de naturezas distintas e variadas intensidades, sendo potencialmente positivo, embora desafiador, para as relações interpessoais intergrupais. Dessa maneira, ao analisar a reflexão de outros a respeito do conflito, Jares (2002) o definiu como sendo:

[…] sinônimo de incompatibilidade entre pessoas ou grupos, ou entre estes e aquelas, ou pelo menos que existem ou se percebem fins e/ou valores inconciliáveis entre uns e outros. De nossa parte, coincidimos com essa visão, isto é, entendemos por conflito um tipo de situação na qual as pessoas ou os grupos sociais buscam ou percebem metas opostas, afirmam valores antagônicos ou têm interesses divergentes. Ou seja, o conflito é essencialmente um fenômeno de incompatibilidade, de choque de interesses entre pessoas ou grupos, e faz referência tanto às questões estruturais como as mais pessoais (JARES, 2002: 135).

Portanto, o conflito é o processo social de desentendimento, de divergência de interesses, oposição de percepções, de desacordo de estratégias para se executar determinados propósitos correspondentes aos anseios e necessidades dos seres humanos em seus grupos sociais.

Nesse entendimento, para Jares (2002, p. 29-48), o conflito possui uma estrutura que o sustenta, sendo ela composta por: (a) causas que o provocam: podendo ser variadas, relativas às questões de poder, à deficiência comunicacional, à estrutura organizacional das ações humanas em seus ambientes coletivos e às interpretações adversas frente às realidades; (b) os protagonistas que intervêm: sendo ao menos dois (pessoas, grupos ou entidades), diretos ou indiretos (os que possuem associação imediata com a origem da causa ou não); (c) o processo em si: que sofre interferência de inúmeras variáveis, como o ambiente social onde se desenvolve o conflito, a natureza do problema, as relações divergentes anteriores, as particularidades dos protagonistas e as estratégias empregadas por esses para lidar com o conflito; (d) o contexto: o cerne do conflito (âmago da compreensão da sua origem, encadeamento, intensificação e possíveis soluções), logo, é o ambiente sociocultural localizado num espaço-tempo onde se desenvolve o conflito.

Assim sendo, não se trata de educadores e educandos a negarem existência do conflito renunciando, com isso, as condições hostis propensas a surgirem nas relações sociopedagógicas cotidianas, e sim, de buscarem meios pacíficos e alternativas viáveis na tentativa de solucionar os problemas que se manifestam.

Além disso, para a organização e o desenvolvimento do trabalho sociopedagógico com as camadas empobrecidas, a fundamentação da Pedagogia da Convivência define alguns conteúdos necessários que servem de insumos para se buscar o convívio pacífico e democrático nos espaços não formais e formais de ensino. Esses elementos trazem as qualidades e atitudes imprescindíveis para se alcançar a conciliação e o bem-viver nas relações sociais mediante seu respaldo nos Direitos Humanos, isto é, como o marco regulador da convivência. Dessa forma, são estes os principais: o respeito, o diálogo, a solidariedade, a não violência, o laicismo, a dinâmica da cultura, a ternura, o perdão, a aceitação da diversidade, a felicidade e a esperança.

O respeito é uma virtude primordial e elementar que possibilita uma convivência democrática e pacífica em benefício da igualdade de direitos. Ele se respalda na benevolência mútua e na dignidade dos indivíduos, ou seja, “supõe a reciprocidade no trato e no reconhecimento de cada pessoa” (JARES, 2008: 31). Paralelamente, o diálogo é um fator fundamental para a harmonia, organização das atividades em grupo e para qualidade de vida dos seres humanos. O ato de conviver se dá mediante ao diálogo, logo, é impossível existir relações sociais sem esse elemento, pois o rompimento com a ação dialógica condiz com a possibilidade da geração de conflitos.

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Por sua vez, a solidariedade é o sentimento de empatia que faz com que os sujeitos compartilhem ações altruístas (através do caráter voluntário e desinteressado) que condicionam a qualidade de humanização das relações sociais. Ela “leva consigo outras duas características muito importantes, a relação com a justiça e a necessidade de transformar as situações injustas” (JARES, 2008: 34). Com isso, pode ser dividida em três características que a constitui: a justiça, a ação e o compromisso com a mudança social.

A não violência é a tomada de decisão em prol da convivência democrática, assegurando a cultura para a paz, tendo como princípio fundamental o respeito à vida do outro. Assim, “se propõe como uma forma de lutar contra a injustiça sem que esta luta implique dano à pessoa ou ao grupo que causa ou apoia a tal a injustiça” (JARES, 2008: 36), uma vez que a violência pode eliminar o conflito, mas não solucionar o problema. Já o laicismo é o princípio que salvaguarda o respeito, a igualdade de direitos e a liberdade de crenças e de consciência dos cidadãos em suas particularidades. “Como consequência, não vai contra as religiões nem contra as crenças morais particulares de cada um, porém se opõe a sua imposição a uma determinada população” (JARES, 2008: 37).

A dinâmica da cultura é referente aos costumes, às formas de agir e pensar de cada grupo social e de cada cidadão. Todas as sociedades e sujeitos têm suas especificidades e realizam trocas culturais com as demais sociedades e com outros indivíduos. Dessa forma, o ser humano acaba sendo culturalmente mestiço devido ao caráter sincrético e ao processo dinâmico e mutável das culturas, assim, a alteridade precisa ser compreendida e deve ser considerada em sua complexidade e singularidade diante do processo de interação social.

A ternura, substancial aos seres humanos, é a afetividade necessária para a manutenção das relações pessoais construída pela benevolência e por gentilezas (comportamentos agradáveis e respeitosos para com os outros sujeitos) que tendem a proporcionar a estabilidade das personalidades individuais e coletivas. Para isso, sua aprendizagem deve ser priorizada dentro do processo educacional.

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O perdão, nessa concepção, corresponde ao movimento de reflexão em direção à lamentação sincera por um mal cometido e, também, a prontificação por parte de quem cometeu o erro (infração ou dano) em não repetir determinada ação para com seu grupo social ou a alguém. Ou seja, é a reconsideração dos seus atos como artifício de reconciliação. “Perdão que não significa impunidade – a condição do perdão para quem o solicita é o reconhecimento da falta, o arrependimento e o compromisso de que não voltará a cometer a mesma ação –, nem muito menos esquecimento” (JARES, 2008: 44).

A aceitação da diversidade é a compreensão e consentimento de que existem diferenças entre os indivíduos e que há características socioculturais dissemelhantes entre os povos. Essas diferenças podem ser positivas (e estimuladas) ou negativas (a serem eliminadas). Diante disso, é necessário que a convivência passe pelo exercício de aceitação da diversidade, que “significa conjugar a relação de igualdade e diferença” (JARES, 2008: 44).

A felicidade é ato de fascinar-se por algo, alguém ou alguma situação. É o deleite diante das coisas (mais simples ou não) do mundo, não se limitando ao individual, estando imbricada nas relações socioculturais, econômicas e materiais. Portanto, é a “capacidade de encantar-se, de ter entusiasmo pela vida” (JARES, 2008: 46).

(Imagen en Flickr)

Por último, a esperança é a expectativa por melhorias (sociais, econômicas, políticas etc.), por coisas boas (agradáveis) que provocam estímulos e movem as ações dos seres humanos mantendo-os vivos. Logo, “a esperança está ligada ao otimismo e, neste sentido, facilita a convivência positiva, com efeito benéfico para a autoestima, individual e coletiva” (JARES, 2008: 47).

À vista disso, os conteúdos/elementos da Pedagogia da Convivência servem como recursos para a construção da coesão social, efetivação de ações democráticas e organização de uma educação voltada para a paz diante do desenvolvimento das práticas sociopedagógicas estabelecidas com as populações marginalizadas. Por consequência, a ausência deles podem causar pequenos empecilhos ou graves conflitos de convivência.

Desse modo, a partir de agora, iremos nos situar no espaço-tempo onde se desenvolveu a pesquisa de campo. Para isso, será apresentada a instituição na qual as investigações foram realizadas, assim como uma breve passagem pela história da localidade, tendo como finalidade enxergarmos um pouco das condições sociais dos agentes educacionais envolvidos.

O local de pesquisa: a instituição socioeducacional e a metodologia de investigação

Para o processo de escolha de onde seria feita a pesquisa de campo, buscou-se realizar um estudo que contemplasse as práticas educativas não formais desenvolvidas por instituições socioeducacionais e as relações dos educadores sociais para com as camadas empobrecidas atendidas em um bairro periférico próximo à Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Faculdade de Formação de Professores (UERJ/FFP).

Em tal caso, priorizando a modalidade da Andragogia, a entidade selecionada foi o Instituto Abraço do Tigre, uma Organização Não Governamental (ONG), sem fins lucrativos, que nasceu no ano de 2002 através de um programa social proposto pela Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos do Porto da Pedra (GRESUPP). Atrelada, inicialmente, ao assistencialismo, a ONG ofertava cestas básicas, curso de artesanato, atendimento médico, ginástica para 3ª idade e algumas categorias esportivas para a população carente local. Com o passar dos anos, passou a oferecer atendimento psicológico, Ensino Fundamental, Médio, cursos de especialização profissional e aumentou o número de especialidades esportivas.

(Imagen Web Instituto Abraço do Tigre)

Em 2013, com a mudança de endereço da Escola de Samba, a ONG passou a ter espaço próprio, e, atualmente, embora alguns projetos e parcerias ainda perdurem, ambas as instituições não mantêm vínculos políticos-administrativo, permanecendo somente a relação afetiva e promocional entre elas (uma vez que a ONG utiliza o símbolo da Escola de Samba).

Por sua vez, a modalidade da Andragogia é a única que é desenvolvida dentro do espaço físico do Instituto Abraço do Tigre, mas que não é cadastrada (não possui vínculo formal). Em 2015, inauguram-se suas atividades devido à iniciativa de uma educadora social que já atuava exercendo a mesma função em outro espaço. Insatisfeita com as condições físicas do ambiente anterior, que implicavam negativamente no processo de ensino-aprendizagem com os adultos empobrecidos, a professora voluntária foi quem procurou a ONG lhe ofereceu, a princípio, a varanda (garagem) para desenvolver as ações socioeducacionais.

Após dois anos atuando nesse espaço físico, ao vagar uma sala, educadora e educandos ganharam um recinto com lousa e recursos didáticos mais apropriados, possuindo, ainda, a área externa para as demais atividades educacionais fora da sala de aula. O grupo de Andragogia contabiliza um total de 20 (vinte) educandos, sendo a maioria de cidadãos negros e moradores de bairros periféricos próximos a ONG e a UERJ/FFP.

Diante disso, o Instituto Abraço do Tigre está localizado em Porto da Pedra, bairro pertencente ao 4º distrito do município de São Gonçalo, Rio de Janeiro. Possuindo a menor extensão territorial dentre as 5 (cinco) divisões distritais, Neves (4º distrito) é composto por 13 (treze) bairros, tem sua altitude, aproximadamente, no nível, e dispondo de uma área total de 12 km². Nesse domínio, a distância física entre a instituição pesquisada e a Universidade é de, aproximadamente, 1.956 metros[1]. Sendo assim, o propósito dessa escolha é a ampliação da produção de estudos acadêmicos articulados aos sujeitos em estado de vulnerabilidade social pertencentes aos arredores da Faculdade como forma de valorização/contribuição da instituição de ensino superior para a região onde está situada.

Nesse contexto, o surgimento do bairro Porto da Pedra compreende o período da segunda metade do século XIX, na qual a localidade sofreu grande movimentação comercial. Segundo Silva (2010), isso ocorreu porque Neves era o principal centro comercial de São Gonçalo, uma vez que seus portos recebiam as produções agrícolas – principalmente a cana-de-açúcar – advindas dos engenhos estabelecidos nas adjacências. Como consequência, a urbanização se deu de forma espontânea à medida que a produção agrícola era levada até os barcos situados na Baía de Guanabara, de onde eram escoados até chegar ao mercado fixado na Praça XV.

Acerca das origens dos bairros Porto da Pedra, Porto Novo, Porto Velho e Gradim – alguns dos primeiros bairros do município e que possuíam funções econômicas semelhantes a partir da mão de obra escrava sustentada, majoritariamente, pelos negros afro-brasileiros –, os registros históricos afirmam que “tiveram como origem os portos que já eram abastecidos por burros-de-carga e cargueiros-de-bois, que levavam a produção agrícola para os barcos que atracavam nestes portos” (BRAGA, 2006: 86). Contudo, o bairro Porto da Pedra, atualmente, sofre com o descaso do poder público, estando com sua infraestrutura degradada e possuindo significativos índices de assalto e violência, cuja presença de facções criminosas gera embates entre elas pela territorialização e, também, com milícias existentes na localidade. Além disso, sua densidade demográfica é de, aproximadamente, 13.541 habitantes, dividida proporcionalmente entre mulheres (52,96%) e homens (47,04%). A faixa etária mais significativa compreende os cidadãos entre 15 e 64 anos (jovens e adultos), sendo ela de 68,3% da população local.[2]

Nessa perspectiva, o principal instrumento utilizado para realizar a pesquisa foi um aparelho celular (smartphone) para conseguir registrar detalhadamente os dados – informações, reflexões e ideias que surgem durante a pesquisa –, que possibilitaram a organização de elementos imprescindíveis para confecção de um caderno de campo. Sendo assim, o diário de campo é um recurso substancial para a realização de uma pesquisa científica no âmbito sociopedagógico forjado em espaços não escolares que atendem as camadas empobrecidas, pois funciona como recurso de sistematização das experiências e, posteriormente, assessora a análise do material suscetível de interpretação.

(Imagen en libresoht)

Dessa forma, para tecer o diário de campo não foi utilizado nenhum tipo de questionário formal. As perguntas e os relatos mais aprofundados (específicos) são consequências da aproximação entre o pesquisador e os atores da educação, logo, à medida que o envolvimento interpessoal foi se concretizando, o diálogo ganhou proporção e, naturalmente, as histórias mais simples e as narrativas mais densas foram produzidas. Portanto, não houve o procedimento de entrevistas estruturadas, apenas semidirigidas – resultantes de diálogos informais – no decorrer de toda a pesquisa.

Por conseguinte, a elaboração do diário de campo priorizou os registros acerca: (a) das relações socioeducacionais promovidas por todos os agentes da educação (professora, educandos e demais profissionais da instituição); (b) da prática (didática) de ensino, especialmente sua metodologia, a interação educadora-educandos e o conteúdo formal ensinado; e, (c) os recursos materiais disponíveis tanto para os professores quanto para os alunos.

A coleta do material em campo, foi inspirada na fenomenologia de Edmund Husserl (1859-1938) para a construção de um método investigativo próprio. Nesse caso, o método utiliza a filosofia fenomenológica para estruturar, basicamente, três ações, nas quais o pesquisador se apoiou para realizar as investigações dentro dos espaços socioeducativos não escolares. Assim sendo, a realidade observada foi tratada como um fenômeno que se apresenta como manifestação da realidade em um determinado espaço-tempo – sendo suscetível às variadas interpretações por parte daqueles que vivenciam tais fatos.

Assim, o pesquisador executou os movimentos de noema, noese e variação eidética para elaborar o arranjo do seu caderno de campo mediante às experiências compartilhadas com os agentes da educação. Esse modelo foi organizado por Ferreira (2015) a partir das leituras de Natalie Depraz (2011) sobre a Fenomenologia de Husserl. Desse modo, podemos compreender o método da seguinte forma explicada abaixo:

  1. O noema corresponde à descrição mais fidedigna possível da realidade, ou seja, é a ação de apreender os fenômenos da forma objetiva realizável, onde o pesquisador irá registrá-los do modo mais detalhado que conseguir. Portanto, “é o aspecto objetivo da vivência, ou seja, a descrição da realidade tal qual ela pode ser entendida e captada pelos sentidos da pessoa, levando em consideração o seu tempo, espaço e história pessoal e social” (FERREIRA, 2015: 8).
  1. O noese está relacionado à descrição/apontamentos dos sentimentos e impressões vivenciadas pelo investigador diante das realidades encontradas nas experiências em campo. Trata-se, logo, do “aspecto subjetivo da vivência, constituído por todos os atos de compreensão que visam apreender o objeto (fenômeno) vivido, tais como perceber, lembrar, sentir, entre outros” (FERREIRA, 2015: 8).
  1. A variação eidética é a parte reflexiva do procedimento de investigação. É o momento cujo pesquisador se põe no lugar dos outros indivíduos que experienciaram aquela mesma realidade, tendo como finalidade de imaginar possíveis maneiras de sentir, (re)agir e pensar frente aos fenômenos vividos. Assim sendo, “é o processo pelo qual podemos levar a nossa consciência todas as variações ou formas possíveis que o objeto (fenômeno) é suscetível a sofrer” (FERREIRA, 2015: 8).

Desse jeito, a inspiração fenomenológica para organização desse método de observação possibilitou ao pesquisador – além do registro objetivo e acurado da realidade – iniciar uma tentativa de compreensão dos demais olhares sobre o mesmo fenômeno (objeto) e captar algo próximo à essência da realidade. Fundamentando-se no paradigma fenomenológico, o pesquisador-educador definiu um viés seguro e legitimado cientificamente que o possibilitou enxergar a organização das práticas (didáticas) socioeducativas elaboradas pelos educadores sociais para atender os educandos pertencentes às camadas empobrecidas.

Com isso, torna-se viável articular a Pedagogia Social, mais especificamente, a Pedagogia da Convivência de Jares (2008), em particular, sua abordagem sobre o conflito nas relações socioeducacionais e os elementos da sua teoria com a organização do trabalho sociopedagógico, uma vez que esses servem de sustentação para a manutenção do grupo em questão. Assim, a partir da exposição teórica e dos insumos coletados em campo, serão, a seguir, realizadas análises pontuais que traduzem parte das convivências que sustentam a dinâmica relacional desses atores sociais.

Os elementos da pedagogia da convivência presente na observação do campo de pesquisa em pedagogia social

A partir da apresentação da Pedagogia Social, do método de observação das práticas educativas inspirados na fenomenologia e da Pedagogia da Convivência e seus elementos, iremos analisar como componentes da teoria de Jares se manifestaram, ou não, no ambiente pesquisado e qual a relevância deles para a prática socioeducativa com as camadas empobrecidas diante daquilo que foi investigado em campo. Para isso, foram escolhidos fragmentos de noemas (descrições da realidade) que ilustram a manifestação da teoria na prática.

(Imagen en Flickr)

Inicialmente, é válido destacar o elemento diálogo como mecanismo imprescindível para cultivar as relações entre os indivíduos, podendo ele se encontrar permeado nos demais elementos da convivência. Nesse caso, ao analisarmos os recortes a seguir, notamos que o diálogo é o recurso primário para comunicação, manutenção e convite (aos sujeitos empobrecidos) para participarem das relações socioeducativas desenvolvidas na instituição, além de servir de instrumento para se lidar com a evasão dos educandos.

Noema 01 – Diálogo da professora sua aluna:

Professora: O dever, não é que ele não está corrigido. Toda vez que eu pego o dever, eu já olho se está certo…
Educanda: Mas bota o sinal!
Professora: Você gosta do “certinho” do lado (com caneta). Agora, eu não gosto ficar dando “certinho” do lado sem olhar direito. Quando eu olho o dever eu já digo: “Tá errado aqui, apaga aqui”. Entendeu? Quando eu pego o caderno é só pra conferir.
Educanda: E quando é pra olhar o lá de trás pra se guiar? Se tiver errado vai ficar tudo errado. Eu preciso disso porque é mais fácil pra eu estudar, porque eu peguei o dever de ontem e não consegui.
– Eu prefiro não colocar o “errado”. Quando eu coloco o errado, vai ter que copiar na próxima folha. É por isso. Mas o dever é automaticamente corrigido. Vou pegar seu caderno hoje e vou corrigir todo, tá?

Noema 02 – Relato da recepcionista dialogando com (futuros) educandos:

Recepcionista: Tem alguns que só aparecem para pedir uma informação, começam a conversar comigo, aí eu falo: “Por que você não volta a estudar? Você não sabe que aqui tem isso, tem aquilo?”. Um casalzinho, um dia passando aqui, perguntou o que tinha aqui, aí eu fui falar com eles e o moço falou: “Poxa! Eu não sei nem ler nem escrever meu nome.”. Eu perguntei: “Por que o senhor não aprende? Tem aula aqui. Por que vocês dois não vêm?”. Aí um dia eles vieram e eu disse: “Vocês assistem, se vocês não gostarem vocês não ficam.”. Eles viraram alunos nossos.

Noema 03 – Narrativa acerca da prática dialógica de educadora social:

– É uma professora só, mas ela dá atenção e ensina de uma maneira que é difícil de ninguém aprender, entendeu? Da maneira que ensina que não te enjoa. Então as pessoas acabaram gostando. Com carinho que vai te dando, as pessoas acabam ficando por causa disso; tem a identificação.

No primeiro noema, podemos visualizar a importância do diálogo para a (re)organização da prática (didática) da educadora social, isto é, como ela faz para aquedar seu trabalho às dificuldades da educanda. No segundo recorte, o diálogo serve de aproximação/convencimento para os educandos voltarem (reiniciarem) seus estudos. Já no terceiro fragmento, o respeito (se forja a partir do diálogo), aparece como característica essencial do trabalho da educadora social para a manutenção do convívio com seus educandos. Com isso, é plausível notar que o “dá atenção” corresponde ao respeito, pois passa pelo reconhecimento de outrem; e o “carinho” dado por ela, acaba cultivando a ternura, ao passo que engendra uma identidade grupal afeta seus alunos. Portanto, o diálogo atua como gerador de outros elementos fundamentais para a convivência entre educadores e educandos.

Nessas circunstâncias, ao investigarmos a turma de Andragogia, evidenciou-se, com maior ênfase e frequência, a presença dos elementos: respeito, ternura e solidariedade, além da felicidade como consequência das boas relações mantidas pelos agentes da educação. De acordo com os recortes abaixo, podemos percebê-los de forma contígua.

Noema 04 – Educanda falando da educadora social:

Educanda: A professora é muito atenciosa e trabalha muito. Daí a gente tenta retribuir. De noite ainda faz lembrancinha. Ela se mata. Ela tá sempre fazendo alguma coisa. Por mais que ela goste, uma hora ela passa mal e cai dura.

Noema 05 – Educadora acerca das relações entre os integrantes da Andragogia:

Pesquisador: Vocês (educandos e educadora social) criam uma amizade?
Professora: Sim, é um vínculo de amizade maravilhoso. Eles são isso que você vê (educandos). São maravilhosos. Tem uns probleminhas, mas faz parte.

Noema 06 – Educadora sobre o progresso de sua aluna nos estudos:

Professora: Ela nunca foi à escola, já tá com a letrinha que você consegue ler. No começo você não entendia nada que ela escrevia. Eu escrevia “visto” e entregava o caderno a ela. Não falava nada que tava errado. Não entendia nada! Agora eu tô entendendo já. Tá bonitinha já a letra dela.

Noema 07 – Professora e sua relação com os educandos:

Professora: As filhas dela (da educanda) ficam pra ela: “Mãe, não vai à escola, não. Você está doente, não sei o quê…”. A outra filha já diz: “Vai sim, mãe”. Aí eu digo: “Vem sim!”.
Educanda: É que a senhora trata a gente com muito carinho.
Professora: Meus alunos são meus amigos.
Educanda: A gente também fica íntimo dela.
Professora: Meus ex-alunos são tudo meus amigos, frequentam minha casa, eu era madrinha de casamento, é uma confusão só!

Podemos ver, nas ocasiões acima, como o respeito se manifesta nos discursos “Daí a gente tenta retribuir”, “Eles são isso que você vê”, “Ela nunca foi à escola… No começo você não entendia nada que ela escrevia” e “trata a gente com muito carinho”. Diante da sua característica central, a reciprocidade, os educandos e educadora exteriorizam o respeito através da compreensão do outro e na ajuda mútua para satisfazer as necessidades do grupo. À medida que os alunos enxergam na professora alguém que lhes doa esforços, eles buscam agir de forma semelhante. Nisso, a professora cultiva o respeito ao passo que compreende as dificuldades dos educandos e os trata com afeição.

Por sua vez, a ternura aparece nas narrativas “A professora é muito atenciosa”, “é um vínculo de amizade maravilhoso”, “A gente também fica íntimo dela” e “Meus ex-alunos são tudo meus amigos”. Sendo assim, é explícito que o elo afetivo construído entre educadora e educandos não somente se dá como recurso que rege as ações práticas referentes ao processo de ensino-aprendizagem, mas também, acaba sendo o elemento gerador do bem-estar dentro e para além da sala de aula, posto que impacta agradavelmente na vida particular deles.

A solidariedade, diante disso, é encontrada nos trechos “Por mais que ela goste, uma hora ela passa mal e cai dura”, “Tem uns probleminhas, mas faz parte” e “Eu escrevia ‘visto’ e entregava o caderno a ela. Não falava nada que tava errado. Não entendia nada!”. Por conseguinte, as educandas percebem o esforço feito por parte da professora, se colocam em defesa dela e exprimem preocupação por ela trabalhar muito. Já a professora, vendo os problemas dos educandos, faz-se compreensiva e disposta a ajudá-los, chegando a esconder as dificuldades de seus alunos para não magoar ou desmotivá-los.

Ainda nos recortes acima, o elemento felicidade surge nas expressões “Tá bonitinha já a letra dela” e “é uma confusão só!”. Nessas situações, é possível ver, no primeiro caso, que a felicidade se expressa como consequência do êxito obtido no trabalho pedagógico, ou seja, o desenvolvimento da grafia; na segunda passagem, a felicidade é fruto do entusiasmo da educadora ao relatar as relações mantidas com os educandos fora da sala de aula.

Nessa perspectiva, pode-se verificar na pesquisa que três dos últimos elementos citados – a ternura, o respeito, a solidariedade – formam um conjunto de elementos significativos que ajudam caracterizar as relações socioeducacionais entre educadores e educandos na classe de Andragogia. Ainda, outros elementos englobam a fala e endossam a configuração da dinâmica do grupo, sendo estes: a diversidade, a esperança e a dinâmica da cultura.

Noema 08 – Vínculo afetivo na turma de Andragogia:

Pesquisador: Como é a relação entre a professora e os alunos?
Educadora social: Ali se forma uma família. Não é só a aula, eles compartilham os lanches, as ideias, as experiências, né? É uma relação de experiência um com o outro, mas não só de escrita, né? É de vida. O mais importante é a inclusão, não importa quem seja. É um meio das pessoas saberem dividir e ensinar as coisas, porque já vem de lá de fora com algumas formas de ver o mundo.

No fragmento anterior, podemos identificar a ternura e o respeito em “Ali se forma uma família” e em “É uma relação de experiência um com o outro, mas não só de escrita, né?”. Sendo assim, a relação de troca e reconhecimento – que ultrapassa a prática formal de ensino – faz com que os sujeitos partilhem de uma reciprocidade afetiva que sustenta uma sólida união entre eles, metaforicamente posta como um “grupo familiar”.

Ademais, a solidariedade é expressa em “Não é só a aula, eles compartilham os lanches, as ideias, as experiências, né?”, cujos laços de companheirismo se dão no compartilhamento das mais variadas circunstâncias de suas vidas, intimidades, formas de agir e pensar. Ainda, o elemento da diversidade pode ser visto na passagem “importante é a inclusão, não importa quem seja”, que demonstra a não exclusão do outro, independentemente das suas particularidades. Dialogando com isso, a dinâmica da cultura, expressa em “porque já vem de lá de fora com algumas formas de ver o mundo”, mostra-se consonante com a diversidade presente à medida que há a compreensão e aceitação do “outro”, que tem numa perspectiva de vida diferente dos demais.

Além disso, no trecho “É um meio das pessoas saberem dividir e ensinar as coisas” fica implícita a esperança de que aquele modo de se relacionar – partilhando experiências e se educando em comunhão – possa ser um caminho para se alcançar os objetivos individuais e coletivo.

Embora menos explicitado, o elemento dinâmica da cultura, nesta pesquisa, apareceu acompanhado da esperança. Vejamos os recortes abaixo: 

Noema 09 – Evasão: circunstâncias pessoais e esperança de voltar aos estudos:

Pesquisador: A aluna desistiu?
Educadora: Não. O marido tá no CTI. Outra dali o marido também tá doente. A outra, uma senhora, tá operada. Tem outra aqui em frente, ótima aluna, tá com problema… O problema dos nossos alunos é que ficam doente fácil, fácil. (…) Márcia e a outra, não tão vindo porque é final de ano e precisam trabalhar pra ganhar dinheiro. (…) Pedro parou porque é camelô. Se estivesse aqui ainda já estaria no 2º Grau. (…) Ele fala: “Poxa, professora, não dá pra voltar.”.

Noema 10 – Evasão: a dinâmica da cultura e expectativa de retorno dos educandos:

Pesquisador: A vida desse pessoal é muito corrida e a evasão acaba sendo grande?
Educadora: Sim, porque sempre sai muita gente pra poder ir trabalhar. Só que eu comecei a querer tirar, aí apareceu uma. (…) Encontrei Carla, ela disse: “Ah! Professora, eu tô querendo voltar. No ano que vem eu posso voltar?”. Eu falei: “Pode. A hora que você quiser as portas estão abertas.”.

Com isso, os trechos “nossos alunos é que ficam doente fácil, fácil”, “é final de ano e precisam trabalhar pra ganhar dinheiro” e “Porque sempre sai muita gente pra poder ir trabalhar” demonstram que, seja por problemas de saúde ou financeiros, a dinâmica de vida (cultural) desses indivíduos interferem negativamente em seus processos socioeducacionais, causando, logo, a evasão da instituição. Como consequência, podemos notar a esperança nos discursos “Pedro se estivesse aqui ainda já estaria no 2º Grau”, ‘Poxa, professora, não dá pra voltar’ e “A hora que você quiser as portas estão abertas”; ou seja, o que resta para educadores sociais e educandos empobrecidos é a expectativa do alunado excluído retomar (quando a vida permitir) e progredir nos estudos.

Por fim, o conflito – necessário e inevitável segundo podemos compreender no decorrer deste trabalho – também se manifestou nas relações socioeducativas durante o período da pesquisa, embora em menor frequência. Nas circunstâncias abaixo, o conflito é enfrentado através de outros elementos, como a solidariedade e a não violência. Vejamos:

Noema 11 – Conflito diante a explicação do exercício de Matemática:

Educanda: É esse aqui (mostrando a folha de exercícios), professora?
Professora: Esse você já fez, minha filha. Não começa daqui! Escreve logo! Não é pulando, é somando! Deixa eu te falar: você fez esse daqui certo? Você consegue fazer o resto sem ninguém te ensinar?
Educanda: Não tem ninguém pra me ajudar lá em casa não! Vai ser só eu e Deus!
Professora: Então Deus vai te ensinar!
Educanda: Vai sim! Essa aqui é de tirar? (mostrando a conta de subtração)
Professora: Aprendeu isso agora? Dois anos aqui e agora você aprendeu, né!? Deixa eu te falar uma coisa: você conseguiu dinheiro pra fazer o exame?
Educanda: Não e nem vou fazer. Eu vou fazer quando tiver dinheiro.
Professora: Vai fazer sim, eu vou te ajudar.

Noema 12 – Festa de encerramento de final de ano:

A educadora comprou presentes para realizar sorteios, mas uma educanda não foi sorteada.
Professora: Quem não ganhou lembrancinha ainda?
Educanda 01: Ela ali!
Educanda (conflito): Eu não quero. Deixa pra lá, deixa pra lá!
Educanda 02: Ela tá chateada dizendo que a professora nunca dá atenção pra ela.
Professora: Se não quer deixa quieto, deixa quieto!
Educanda (conflito): Não! Desde aquele dia que você trouxe o bolinho que dona Lourdes está estranha comigo. Tanto faz, eu não vou ficar mais aqui não. Vou não!
Educanda 01: Pega o presente, eu tenho outro.
Educanda (conflito): Não é isso não. Ela sempre faz tudo primeiro pros outros e depois me esquece aqui.
Educanda 01: Ela esqueceu também da outra ali, não foi só você não.
Educanda (conflito): Não interessa! Eu vou parar de frequentar aqui!
Professora: Calma aí. Vou ver se tem mais sorteio ali, vou achar mais. Tem mais presente ali. Achei dois. Vamos ver quem vai ganhar esse. Vou sortear… Você! Você ganhou no sorteio!
Educanda (conflito): Não precisa não!
Professora: Não quer não? Esse foi sorteio, eu não escolhi não.

(…) Após os sorteios, a professora relatou a outra educadora social:

Professora: Hoje, se a gente não é de circo, ia dar confusão hoje, né? Todo mundo levando na esportiva, mais rolou um “auê”. (…) Pra descontrair, eu camuflei aqui a menina que tava sentada e que me deu o presente dela, aí eu peguei, fingi um sorteio e dei pra outra que estava reclamando. Fiz uma brincadeira e todo mundo riu, mas ela (a educanda descontente) continuou na rigidez dela. Todo mundo brincou, menos ela. Tem que ser de circo, hein! Se a gente não é de circo iria dar problema. Tem que ter jogo de cintura.

Nos noemas supratranscritos, há o desenvolvimento de duas situações conflituosas. No primeiro caso, podemos perceber o que conflito (mal-estar que gerou tensão) se desenrolou ao passo que educadora e educanda se estranharam durante a solicitação da explicação da atividade de Matemática. Assim, ambas ficaram impacientes à medida que a professora não entendeu as dificuldades da aluna. Entretanto, no meio da discussão, de repente, a educadora mudou o foco do assunto: “você conseguiu dinheiro pra fazer o exame?” e “Vai fazer sim, eu vou te ajudar”. Esses recortes evidenciam a tomada de atitude proveniente da educadora social que, para evitar que o conflito se alastrasse, agiu com altruísmo (característica da solidariedade) perante aos problemas pessoais de sua aluna.

No que concerne o conflito explicitado no noema 12, diante da discussão que tornava o ambiente hostil, a professora, como subterfúgio, utiliza-se da não violência evitando dar continuidade ao assunto e atender á demanda da educanda que, aparentemente, queria atenção e ser presenteada. Com isso, os trechos “Se não quer deixa quieto, deixa quieto”, “fingi um sorteio e dei pra outra que estava reclamando”, “Tem que ser de circo” e “Tem que ter jogo de cintura”, mostram o esforço empregado pela educadora social para apaziguar o sentimento desarmonioso que se comprometia o bem-estar até então dominante entre os sujeitos que participavam do evento.

Portanto, a configuração acima apresentada nos permitiu visualizar, de forma detalhada, como os Elementos da Convivência definidos por Jares (2008) estão imbricados nas experiências socioeducacionais vivenciadas na turma de Andragogia, na manutenção das práticas (didáticas) e nos demais espaços fora da sala de aula pertencentes à ONG, onde os educandos empobrecidos e educadores sociais mantêm relações extrapolando a convivência forjada no interior da instituição.

Entre convivências e práticas socioeducativas, chegamos a algumas considerações finais

A partir das investigações das práticas socioeducativas realizadas com as camadas empobrecidas, torna-se plausível afirmar que a Pedagogia da Convivência (JARES, 2008), como campo teórico-prático instrumentalizado a partir da Pedagogia Social, é um caminho viável para se estruturar o trabalho didático desenvolvido em ambientes não escolares e preservar a estabilidade do convívio dos atores envolvidos.

(Imagen en Pixabay)

Diante disso, seus elementos da convivência de Jares (2002; 2008) mostraram-se essenciais em diversas circunstâncias, dentre elas: na manutenção do bem-estar entre os indivíduos pesquisados (em especial, nos momentos conflituosos); na adequação da didática da educadora social para atender as demandas dos seus educandos (seu “fazer pedagógico”); na construção e preservação de uma identidade coletiva; na tentativa da atenuação da evasão dos sujeitos pobres da instituição social e, não menos importante, nos impactos provocados na vida particular de cada um dos agentes educacionais (nas relações afetivas que perpassam o exercício profissional dos educadores sociais para com os educandos pobres).

Ademais, foi possível identificar que – sistematizada, ou não, pelos educadores sociais – a Pedagogia da Convivência teve diversos dos seus componentes permeados nas ações práticas construídas com os educandos carentes provenientes dos bairros periféricos de São Gonçalo – RJ. Nessa ocasião, diálogo, respeito e solidariedade, respectivamente, foram os elementos que se manifestaram com maior periodicidade, sendo os dois últimos daqueles que se expressaram de modo mais intenso, mais invasivo nas relações do cotidiano educacional. Logo, no conflito (cf. JARES, 2002: 135), tratado de forma positiva, se produz os elementos da convivência que são arquitetados nas relações interpessoais e nas práticas (sócio)didáticas encontradas nesse ambiente educativo não escolar com as camadas empobrecidas.

E, por fim, através dessa pesquisa inferimos que a Pedagogia da Convivência de Jares (2002; 2008) corrobora o contexto das reflexões teóricas da Pedagogia Social Brasileira – delineada por autores como Souza, Silva e Moura (2009), Gadotti (2015) ou Ferreira (2018) – que as práticas socioeducativas são: espaços de valorização dos saberes dos sujeitos em vulnerabilidade social; de promoção de processos de conscientização da realidade social; de práticas emancipatórias; e, de exercício de autonomia diante das desigualdade social através dos elementos sociais – baseados nos Direitos Humanos – que organizam a convivência humana.

(Imagen en Pxfuel)

Assim, a Educação Social se manifesta como a possibilidade de novas formas de convivência social entre educadores, educandos, assim como, a sociedade fluminense contemporânea.

Bibliografía

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Caliman, G. (2010). Pedagogia Social: seu potencial crítico e transformador. En Revista de Ciências da Educação, Americana, n. 23, p. 341-368.

Depraz, N. (2011). Compreender Husserl. Petrópolis: Vozes.

Ferreira, A. (2018) Dentro e fora da sala de aula? O lugar da pedagogia social. Curitiba: CRV.

– (2015). O uso da fenomenologia nas práticas de estágio supervisionado para        licenciaturas. En Revista Brasileira de Ensino Superior. Passo Fundo, v. 1, n. 2, p. 5-14.

Gadotti, M. (2012). Educação popular, educação social, educação comunitária: conceitos e práticas diversas, cimentadas por uma causa comum. En Revista Diálogos, v. 18, n. 2, p. 10-32.

Jares, X. (2002).  Educação para a paz: sua teoria e sua prática. 2ed. Porto Alegre: Artmed.

– (2008). Pedagogia da Convivência. São Paulo: Palas Athenas.

Otto, H. (2011). Origens da pedagogia social. En Moura, R. Silva, R. Souza, J. (2011). Pedagogia Social. Vol. 1. São Paulo: Expressão e Arte.

Silva, S. (2010). São Gonçalo no Século XIX. Niterói: Nitpress.

Souza, J. Silva, R. Moura, R. (2009). Pedagogia social. São Paulo: Expressão e Arte.

Souza. J. (2010). Pedagogia social: a formação do educador social e seu campo de educação. En Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE-UFES. Vitória, v. 16, n. 32, p. 26-64, 2010.

SÃO GONÇALO – RJ. Disponível em: http://www.saogoncalo.rj.gov.br/mapas.php. [06 de fevereiro de 2019].

Para contactar

Arthur Vianna Ferreira. Email: arthuruerjffp@gmail.com

[1] Dado coletado através do Google Earth. A rota foi calcula através do segmento de logradouro principal entre a UERJ e a ONG Instituto Abraço do Tigre.

[2] Os dados demográficos foram consultados no site correspondem ao Censo de 2010. Disponível em: http://populacao.net.br/populacao-porto-da-pedra_sao-goncalo_rj.html. Acesso em: 06 de fevereiro de 2019. Às 14h27min.

Fecha de recepción del artículo: 30/03/2021
Fecha de aceptación del artículo: 07/04/2021